Esta
semana vi no twitter de alguém um link para a tabela que está aqui ao
lado. Ela sintetiza um discurso que nos últimos anos se tornou moda
entre grande parcela dos cristãos brasileiros: o grupo que passou a
satanizar a igreja institucional. Segundo esse segmento, a igreja (com
letra minúscula) é o grande mal do universo. Não mais as obras da carne,
o pecado, o mundo, o diabo, nada disso. A maligna, satânica e perversa
igreja organizada é o vilão da hora. O lema desse grupo poderia ser
resumido a “tornei-me cristão quando saí da igreja”. Legiões têm
abraçado esse discurso e passado adiante essa ideologia, em geral em
redes de relacionamento, blogs e sites da internet. Analisei esse quadro
e gostaria de tecer comentários a respeito (em breve abordarei em
detalhes aqui no APENAS os pontos apresentados nesse quadro, mas por ora
me atrevo a fazer uma consideração geral).
Antes de mais nada, é importante dizer que amo Jesus. Fui chamado
pela graça, resgatado sem merecer e justificado exclusivamente pelo
sangue do Cordeiro, sem mérito ou obra que me valesse. Por isso, busco
Jesus de Nazaré. Sou grato a Ele. Preciso dele a cada passo, contando
com sua misericórdia para me perdoar diariamente de minha multidão de
pecados. Sei que só em sua pessoa, na seiva que corre na videira
verdadeira, posso obter a vida – e por isso mesmo meu interesse é
encontrá-lo onde Ele estiver. Ao mesmo tempo estou ciente dos absurdos
que acontecem em muitas igrejas. Teologia da Prosperidade, igrejas onde
se oprimem membros com usos e costumes humanos, congregações de fachada
para o exercício de poder humano, legalismos vazios, cultos sem
espiritualidade, politização e capitalização da fé… enfim, todos os
descalabros que estamos acostumadíssimos a ver em diversos rincões por
aí.
Por isso compreendo que, juntando-se o amor por Jesus à percepção
desses absurdos no seio da chamada igreja evangélica, é natural que
muitos decidam apedrejar o conceito de “igreja” para defender a causa de
Cristo. Afinal, é a saída mais rápida e fácil. É a solução do médico
que, para curar uma unha encravada, decide amputar a perna. Sim, isso é
exatamente o que vem acontecendo: bons cristãos, ansiosos por uma vida
profunda em Jesus, se revoltam contra o tanto de abuso e opressão que
enxergam em determinadas igrejas e denominações que saem atacando o
conceito – em vez de atacar os problemas.
O
principal erro no discurso dos que demonizam a igreja institucional é o
generalismo. A tabela acima estaria perfeita se viesse a se referir a
determinadas congregações e denominações. Ela seria verídica se dissesse
“igreja x” ou “igreja y”. Mas anatemizar o universo de todas as igrejas
organizadas por causa dos maus exemplos é de uma irresponsabilidade,
ignorância e superficialidade dignas de nota. Jesus é um, então Ele pode
ser tomado como medida de comparação. Mas “igreja” (novamente: com
minúsculas) é um substantivo comum que designa tantos modelos diferentes
de reuniões de cristãos que construir uma comparação apenas a partir
desse termo já é um equívoco em si.
De qual igreja estamos falando?
Neopentecostal? Tradicional? Presbiteriana? Batista? Católica romana?
Ortodoxa? A dos puritanos? A dos morávios? A de John Wesley? A de
Agostinho? A das catacumbas? A monástica? A de Tomás à Kempis? Luterana?
Calvinista? Anglicana? Episcopal? Congregacional? Pentecostal? As
comunidades alternativas dos desigrejados? A da minha esquina? A do
leitor? Qual?
E não é só isso. Dentro desse universo de expressões institucionais
que chamamos de “igreja”, há cristãos sérios e também falsos cristãos,
simultaneamente. Peguemos uma igreja organizada qualquer. Dentro dela
você encontrará pessoas espirituais e pessoas carnais, interesseiras ou
devotadas, pastores canalhas e pastores piedosos, homens de Deus e joio
do diabo. Então, dentro desse universo pluralista, cheio de nuances,
cores e tons, criar uma tabela ou um discurso generalizando o conceito
“igreja” é tentar embutir o oceano num copo d’água. Fazer isso é julgar
inocentes, chamar de opressores muitos homens que pregam a liberdade e a
piedade, acusar os que Jesus não acusa. Logo, é em sua essência
bastante anticristão.
Lembremos sempre da pergunta de Abraão a Deus em Gênesis 18:
“Exterminarás o justo com o ímpio?”. Ao que o Senhor responde que se
houver dez justos ao menos em Sodoma Ele não destruirá a cidade.
Quem critica desse modo generalista e irresponsável a “igreja
institucional”, a exemplo do autor da tabela acima, está usando o mesmo
raciocínio de “homem não presta”. Isso geralmente é dito por alguma
mulher que foi magoada por um, dois ou no máximo três homens. Mas há
cerca de 3,5 bilhões de homens no mundo! Então afirmar que “homem não
presta” é um generalismo brutal e bem injusto. Do mesmo modo, dizer que a
“igreja” é isso tudo o que a tabela e que o discurso anti-igreja
institucional dizem é no mínimo brutalizante.
Além
disso, é de uma ignorância histórica patente. Lógico que a igreja errou
muito ao longo de sua trajetória, com os exemplos clássicos da
inquisição, omissão na Alemanha nazista, papado carnal, indulgências e
outros desmandos mais. Ela é formada por homens, como alguém esperaria
que ela não errasse? Errou do mesmo modo que errou a Igreja (com
maiúscula) de Atos dos Apóstolos, que tinha em seu seio mentirosos e
ladrões como Ananias e Safira, homens que se repreendiam na cara como
Paulo e
Pedro, discórdias como a de Paulo e Barnabé, entre muitas outras
questões vistas nas epístolas e em Apocalipse (e não vejo ninguém
demonizando a Igreja apostólica). Mas quem sataniza a igreja
institucional ou ignora ou sofre de amnésia a respeito de tudo o que ela
já fez e que ainda faz pelo Reino de Deus.
Pra começar, foi dentro de uma igreja institucional que Jesus me
chamou à salvação. Só isso já me torna eternamente grato. E
provavelmente você que me lê aqui também veio a conhecer Cristo numa
igreja organizada. E possivelmente a maioria das pessoas que criticam a
igreja! Esse tem sido ao longo de dois milênios o papel principal dessa
igreja tão falha, tão pecadora e tão…humana. Humana assim como eu e
você, que erramos todos os dias, pecamos sempre e ainda assim o Espírito
Santo permanece habitando em nós e fazendo coisas boas por nosso
intermédio – tesouro excelente em vasos de barro. Deus não nos fulmina
por errarmos (senão eu, por exemplo, já seria cinza e pó há muito
tempo), Ele nos chama ao arrependimento. Por que com a igreja organizada
que comete deslizes seria diferente? Lembremos das palavras de Paulo em
Rm 14.3: “Aquele que come de tudo não deve desprezar o que não come, e
aquele que não come de tudo não deve condenar aquele que come, pois Deus
o aceitou”. Condenaremos quem Deus aceitou? Como podemos ter a
arrogância de pressupor que Deus rejeitou a igreja institucional como um
todo?
Com todos os seus erros, a igreja conduziu milhões ao conhecimento de
Cristo ao longo dos séculos, perpetuou as Escrituras, levou a mensagem
da salvação aos cativos, empreendeu ações missionárias extremamente
relevantes e ajudou a levar educação, saúde e apoio humanitário a
multidões. Exatamente como faz hoje. Disso os críticos generalistas da
igreja organizada aparentemente não se lembram (ou será que nunca
estudaram História da Igreja? Ou será que não leem notícias da igreja
pelo mundo?).
Conheço
muitas igrejas institucionais, denominacionais, onde homens e mulheres
de Deus buscam o Senhor de modo verdadeiro. Conheço muitos pastores
piedosos e obedientes à Palavra. Conheço muitas, mas muitas pessoas que
foram resgatadas do pecado, das drogas, do crime, da corrupção, do
espancamento, da opressão familiar, de crises existenciais, da depressão
e, principalmente, do inferno, por Cristo por intermédio das chamadas
igrejas institucionais. Não posso, por isso, demonizá-las, pois estaria
chamando de demoníaco aquilo que Deus torna sagrado ao utilizar como
canal de bênção.
No capítulo 12 do evangelho segundo Mateus, os fariseus acusaram
Jesus de expulsar demônios pelo poder de Belzebu (“Mas quando os
fariseus ouviram isso, disseram: “É somente por Belzebu, o príncipe dos
demônios, que ele expulsa demônios” – Mt 12.24). Ou seja: demonizaram o
próprio Cristo. Hoje o mesmo está sendo feito com a igreja como um todo
por tais críticos. Além disso, incorrem aqueles que acusam o conceito
generalizado de “igreja” de agir contra Jesus o perigo de estar
dividindo aquilo que Deus quer unir. Curioso é notar que no versículo
seguinte, Mt 12.25, o texto bíblico nos diz: “Jesus, conhecendo os seus
pensamentos [dos fariseus], disse-lhes: ‘Todo reino dividido contra si
mesmo será arruinado, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não
subsistirá”. Será que no afã de purificar a casa – cheios de boas
intenções – os críticos da igreja institucional não estão dividindo a
Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo?
Será que ao generalizar que TODA
igreja organizada é um câncer o Corpo não está ferindo a si mesmo?
Tenhamos responsabilidade. Precisamos lutar sempre pela purificação
daquilo que está errado dentro da Igreja. Mas dizer que isso se faz pela
aniquilação da igreja institucional é miopia espiritual e histórica,
além de falta de amor. Combatamos o pecado. Oremos contra os falsos
mestres. Preguemos contra as heresias. Desmascaremos as doutrinas de
demônios. Denunciemos os líderes abusadores. Mas não generalizemos ao
irrefletidamente acusar um organismo que ainda abriga milhares que não
se curvaram a Baal de ser algo do mal. Pôr Jesus em oposição à igreja
(com minúscula) é contrapor o Salvador à Igreja (com maiúscula) – que
está presente aos milhões dentro dessas instituições imperfeitas. É
jogar o Noivo contra a noiva. O Pastor contra as ovelhas. E não acredito
que Deus fique muito feliz com isso.
Paz a todos vocês que estão em Cristo.
Uma reflexão execelente de Maurício Zágari.
Fonte:http://www.supermulhermaravilha.blogspot.com.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Blog Religare agradece pelo comentário! Deus o abençõe!